O Líbano, a Soberania Civil e a Piedade fora de Israel, de acordo com as Escrituras
Isaar Soares de Carvalho – 04/12/2020
Introdução
Nesta breve reflexão trataremos de diversas
passagens da Bíblia que fazem referência ao Líbano, seja à exuberância da natureza,
ao comércio, à cultura, bem como à sua fé, mostrando caráter laudatório tanto do
Líbano quanto de seu povo na Bíblia.
1 – O termo “Líbano”
De acordo com o Smith's Bible Dictionary, o Líbano é
“uma cadeia de montanhas no norte da Palestina. Líbano significa branco, sendo o termo usado em relação à neve, que
durante parte do ano cobre o cume do monte, bem como devido à brancura das
falésias e dos picos calcários”. (https://www.biblestudytools.com/dictionaries/smiths-bible-dictionary/lebanon.html, acesso: 08/12/2020).
É chamado de a montanha
branca da Palestina. Está localizado nas narrativas bíblicas na fronteira ao Norte
de Israel, sendo descrito como um lugar extremamente fértil.
As Escrituras se referem à
sua faixa ocidental quando usam o termo Líbano.
A sua faixa oriental foi chamada de Anti-Libanus
pelos geógrafos, sendo mencionada na Bíblia como “todo o Líbano em direção ao nascer do sol” (Js 13.5).
2 – Algumas
das principais referências ao Líbano na Bíblia
A) Nos Livros
Históricos o Líbano é mencionado em Deuteronômio
1.7; 3.25; 11.24; Josué 1.4; 9.1;
11.7; 12,7; 13,5; 13,6; Juízes 3.3;
9,15; I Reis 4.33; 5,6; 5,9; 5,14; 7,2;
9,19;10,17;10,21; II Reis 14,9;19,23;
II Crônicas 2,8; 2,16; 8.6; 9,16; 9,20;
25,18 e Esdras 3,7.
B) Nos Livros
Sapienciais o termo Líbano aparece
em Salmos 29.5-6; 37.35; 72.16; 92.12;
104.16; Cantares 3,9; 4,7-8; 4.11;4,15;
5,15 e 7,4.
C) Nos Livros
Proféticos está presente em Isaías
2.3; 10.34; 14.8; 29.17; 33,9; 35.2; 37.24; 40.16; 60.13; Jeremias 18.14; 22.6; 22.20; 22.23; Ezequiel 17.3; 27.5; 31.3; 31.5; 31.16; Oséias 14.5-7; Naum 1.4; Habacuque 2.17 e Zacarias 10.10 e11.1.
3 – Surpresas
da Bíblia: A piedade dos estrangeiros e Israel como terceiro face ao Egito
A)
As cidades de Tiro e Sidom são mencionadas por Jesus aos judeus impenitentes
como exemplos de piedade, quando ele diz: “Ai de ti, Corazim! Ai de ti, Betsaida! Porque, se em
Tiro e em Sidom se tivessem operado os milagres que em vós se fizeram, há muito
que elas se teriam arrependido com pano de saco e cinza. E, contudo, vos digo:
no Dia do Juízo, haverá menos rigor para Tiro e Sidom do que para vós outras”
(Mt 11:21-22).
B) Jesus
menciona também a piedade da viúva de Sarepta
diante da incredulidade que encontrou em de Cafarnaum,
e disse que “muitas viúvas havia em Israel no tempo de Elias e a nenhuma delas
foi Elias enviado, senão a uma viúva de Sarepta
de Sidom. Havia também muitos leprosos em Israel nos dias do profeta
Eliseu, e nenhum deles foi purificado, senão Naamã, o siro” (Lc 4:24-27).
C) Outros
estrangeiros também foram elogiados por Jesus devido à sua piedade, mostrando que
Deus encontra aqueles que lhe agradam fora de Israel: “A
rainha do Sul se levantará, no Juízo, com os homens desta geração e os
condenará; porque veio dos confins da terra para ouvir a sabedoria de Salomão.... Ninivitas
se levantarão, no Juízo, com esta geração e a condenarão; porque se
arrependeram com a pregação de Jonas...” (Lc 11:30-32). Para nossa surpresa,
até o Egito é chamado de primeiro por Deus em relação a Israel, segundo Isaías,
que diz: “Naquele dia Israel será o terceiro com os egípcios e os assírios, uma
benção no meio da terra; porquanto o Senhor dos exércitos os tem abençoado,
dizendo: Bem-aventurado seja o Egito, meu povo, e a Assíria, obra de minhas
mãos, e Israel, minha herança” (Is 19;24-25).
D) Jesus nos
surpreende, por outro lado, ao se referir às pessoas dignas de arrependimento
nas cidades de Sodoma e Gomorra, criticando os impenitentes de Israel, ao dizer:
“E se ninguém vos receber, nem ouvir as vossas palavras,
saindo daquela casa ou daquela cidade, sacudi o pó dos vossos pés. Em verdade vos digo que, no dia do juízo, haverá menos rigor
para a terra de Sodoma e Gomorra do que para aquela cidade” (Mt 10,14-15).
4 – Referências
às relações comerciais e políticas entre Israel e o Líbano na Bíblia
Além de Salomão ter importado cedro do Líbano, e
tendo o cedro sido usado também na construção do Segundo Templo, há uma menção sobre
relações comerciais entre as cidades de Tiro e Sidom com o rei Herodes, no Séc.
I da nossa era, conforme registra o Livro de Atos 12:20: “Ora, havia séria divergência entre Herodes e os
habitantes de Tiro e de Sidom; porém estes, de comum acordo, se apresentaram a
ele e, depois de alcançar o favor de Blasto, camarista do rei, pediram
reconciliação, porque a sua terra se abastecia do país do rei”.
5 - Referências específicas sobre o cedro em alguns textos do AT
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Salmos 29:5: Metáfora sobre a força dos cedros, mostrando o poder
de Deus: “A
voz do Senhor quebra os cedros; sim, o Senhor despedaça os cedros do
Líbano. Ele os faz saltar como um bezerro; o Líbano e o Siriom, como bois
selvagens”.
Salmos 104:16-17: Para o salmista,
o cedro foi plantado por Deus e deste provém o seu vigor: “Avigoram-se as
árvores do Senhor e os cedros do Líbano que ele plantou, em que as aves
fazem seus ninhos"
Isaías 2:13: Descreve os cedros do Líbano são “altos e mui elevados”.
Isaías 14:7-8 É de se entender que os cedros eram objeto de exploração
indevida durante o cativeiro da Babilônia, pois em sua promessa de
libertação de Israel diante do opressor, pois Isaías afirma, ecologicamente:
“Já agora
descansa e está sossegada toda a terra. Todos exultam de júbilo. Até os
ciprestes se alegram sobre ti, e os cedros do Líbano exclamam: Desde que tu
caíste, ninguém já sobe contra nós para nos cortar.
Ezequiel 27:4-5: Em
uma profecia contra Tiro, Ezequiel fala da riqueza da cidade, da qualidade
das embarcações e dos instrumentos de navegação, referindo-se à resistência
do cipreste e do cedro, ao dizer: “No coração dos
mares, estão os teus limites; os que te edificaram aperfeiçoaram a tua
formosura. Fabricaram todos os teus conveses de ciprestes de Senir; trouxeram cedros do Líbano, para te fazerem mastros”. A resistência do
cedro é mencionada também no Livro de Juízes.
O cedro do Líbano foi usado no
templo de Salomão, que pediu a Hiram, rei de Tiro, que o mandasse cortar,
bem como lhe enviasse a madeira, pois em Israel não havia quem cortasse a madeira tão bem quanto os sidônios (I s 5:6).
O profeta Oséias louva o cedro, a oliveira e a vide, seu
fruto e sua sombra, bem como os cereais, e compara a benção de Deus a
Israel ao vinho do Líbano
(Os 14:5-7).
A
referência feita no Salmo 92 ao cedro do Líbano e à palmeira é de grande
valor moral e espiritual. Quando os fiéis ouviam a leitura do Salmo em seu
contexto geográfico e cultural, eram-lhes de fácil assimilação suas
referências à natureza. De modo semelhante, as parábolas de Jesus com
conteúdo bucólico constituíam-se num hábil recurso persuasivo, pois seus
ouvintes poderiam, por associação de significados, entender a sua mensagem
(apesar de haver em seus discursos também aqueles enunciados que são
chamados de “ditos enigmáticos” pelos especialistas no Novo Testamento).
Considerações Finais
Do ponto de vista hermenêutico, ter
feito esse Curso foi uma oportunidade de grande aprendizado, bem como em
relação à fé, pois as considerações sobre a resistência do cedro do Líbano
me fortaleceram, especialmente pelas referências às raízes profundas do
cedro. Dessa forma, fiquei impressionado diante do fato de um evento tão
relevante academicamente apresentar um conteúdo teológico tão elevado e
demonstrar seu respeito pela visão de mundo religiosa, longe de considerar
que a religião seja o ópio do povo, como tem prevalecido em grandes
universidades do Ocidente, especialmente no Brasil.
Por outro lado, ainda na questão
hermenêutica, ao reler a narrativa do Livro de Juízes sobre o apólogo de
Jotão, cuja narrativa termina dizendo que “todas as
árvores disseram ao espinheiro: Vem tu e reina sobre nós”, ao que estre
respondeu: “Se, deveras, me ungis rei sobre vós, vinde e refugiai-vos
debaixo de minha sombra; mas, se não, saia do espinheiro fogo que consuma
os cedros do Líbano” (Juízes 9.14-15), observei que na obra Do Cidadão Thomas Hobbes
interpreta essa passagem em relação ao caráter absoluto da soberania, procurando justificá-lo em relação ao fogo que procede do espinheiro, o que faz também em relação ao texto
de I Samuel 8, que trata do direitos do rei quando da instituição da monarquia em Israel através de Samuel, quando então ficou claro o caráter absoluto da soberania, vindo da boca do próprio profeta..
Porém o citado texto de Juízes pode ser lido a partir de outra perspectiva, a de que o fogo do
espinheiro poderia queimar até o resistente cedro do Líbano. Isso mostra, metaforicamente, que o caráter
absoluto do poder civil pode chegar a ser, de fato, destruidor como o fogo. Dessa forma, enquanto Hobbes interpretou essa passagem para justificar o
caráter absoluto do poder civil, o que Jotão fez foi, ao contrário, mostrar
a sua periculosidade. Porém o povo
aceitou ser dirigido por Abimeleque, representado como o espinheiro no
apólogo de Jotão, vindo o país a passar por um período de violência e de
ausência de paz civil durante o seu mandato, mesmo que Jotão tenha se
servido de uma símile tão pedagógica para preveni-lo dos perigos de serem
governados por um “espinheiro” de quem procedia fogo capaz de queimar o
cedro do Líbano.
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