domingo, 13 de abril de 2008

A Fé e o Agnosticismo em Hobbes

1 - Sobre a Fé e a Obediência a Deus na obra Do Cidadão:

A - “Há apenas um Deus”. (Do Cidadão. Trad., Adaptação e Notas de Renato Janine Ribeiro. S. Paulo: Martins Fontes, 1a. ed., p. 309).

B – Ao final da Epistola Dedicatória do Do Cidadão, escreve:“Que o Deus do céu coroe Vossa Senhoria com longa vida nesta estação mortal, e, na Jerusalém celestial, com uma coroa de glória”. (p. 9-10).

C – A obediência a Deus está em primeiro lugar:“...Como devemos obedecer antes a Deus que aos homens...”. (Parte III, Cap. XVIII, p. 359-60). É possível que Hobbes baseie-se em Atos 5, 29 , que diz: “Então Pedro e os demais apóstolos afirmaram: Antes importa obedecer a Deus do que aos homens”.

D – O que é necessário para a salvação:“O propósito dos evangelistas prova que para a salvação é necessário apenas crer num só artigo – que Jesus é o Cristo” (p. 367). É possível que o texto de I Pd 1,9 sirva de base a Hobbes para a citada afirmação: “...Obtendo o fim da vossa fé, a salvação das vossas almas”.

D.1 - Renato Janine Ribeiro observa, na Introdução de Do Cidadão, que muitas discussões e divisões , e mesmo guerras, são feitas em torno de disputas teológicas que não dizem respeito ao essencial: a salvação.

D. 2 - O pensamento de Hobbes, de acordo com o próprio filósofo, não poderia ser declarado herético, pois a doutrina do Leviathan não era contrária ao Credo Niceno. Isso é afirmado na Encyclopaedia Britannica:

"He maintained that since the aboliton of the high court of comission there was no court of heresy to which he was amenable and that in any case nothing was to be declared heresy but what was at variance wiht the Nicene creed, as the doctrine of Leviathan was not". (Vol. XI, 1964, p. 566, verbete Hobbes, Thomas, por G. Wm.)

E - Em relação ao conflito entre a obediência ao príncipe e ao que é necessário para a salvação eterna, Hobbes afirma que o cidadão tanto recai em desobediência injusta ao príncipe quanto pode desobedecer-lhe visando preservar a vida eterna, caso sua ordem seja contrária à salvação. Assim, ele confirmaria a idéia presente no Livro de Atos sobre importar mais obedecer a Deus que aos homens, afirmando: “Seria loucura de nossa parte não preferir morrer de morte natural, em vez de obedecer e morrer eternamente”. (p. 360).

2 - Sobre o agnosticismo de Hobbes em relação a determinados pontos:

A – Ocorrência de Milagres - Do Cidadão: Parte I, Cap. I, p. 31, par. 2: “... Se acontecer que, numa reunião, se passe o tempo contando histórias..., se um conta alguma maravilha, os demais narrarão milagres, se os tiverem, se não tiverem os inventarão”. No Leviathan ele afirma que não ocorrem mais milagres, os quais teriam durado até à época da Igreja Primitiva.

B – Declara ser impossível fazer pactos com Deus, e tanto em Do Cidadão quanto no Leviathan ele é cético quanto aos votos feitos a Deus, mas isso em relação à sua validade do ponto de vista da supremacia da Religião sobre o Soberano (Estado), pois só são válidos os pactos legitimados pelo poder civil, e nesse caso, por força da argumentação, a própria validade do voto feito a Deus terá de ser advinda do Soberano. (Ver: Do Cidadão: Parte I, Cap. II, p. 52-53, par. 12-13, e a nota explicativa de Janine sobre os que faziam votos a Deus e poderiam incitar à desobediência civil).

C – Hobbes é cético em relação ao que os homens falam diretamente a partir de Deus, reduzindo Sua Palavra ao que dizem as Sagradas Escrituras, mas isso, dentro de sua concepção da paz civil, é bem explicado no Leviathan, cap. XXXVI, cujo título é: “Da palavra de Deus e dos profetas”, ver p. 256). No Do Cidadão ele afirma: “Deus não nos fala mais através de Cristo e de seus profetas em voz aberta, mas pelas Sagradas Escrituras, as quais diferentes homens compreendem de modo diferente”. (Idem, p. 360).Segue-se disso, em sua filosofia civil, que o Estado deve interpretar ou delegar a alguém a interpretação que seja de acordo com a consecução da paz civil.

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